Vinicius continua seduzindo

Vinicius e Tom Jobim


Ontem teve início o Festival do Rio de Cinema, com a exibição do filme Vinicius, no Odeon. O público divertiu-se muito, sobretudo com as diferentes interpretações das músicas de Vinicius e com os depoimentos divertidos de Edu Lobo, Toquinho, Caetano Veloso, Maria Bethania, Gilberto Gil, Ferreira Gullar e outros. Para vocês terem uma idéia da hilaridade do negócio: Chico Buarque, reunido com outros grandes nomes da música brasileira, conta uma conversa que teve com o Vinicius, já ao final da vida deste. O papo que rolava era sobre reencarnação. O Chico pergunta ao poeta de que jeito ele gostaria de reencarnar, caso esse troço existisse. Vinicius responde que gostaria de reencarnar com o mesmo corpo e com a mesma cabeça, depois pára, pensa um pouco e completa: "mas com o pau um pouquinho maior". Todos caem na gargalhada.

O documentário, dirigido por Miguel Faria Jr, é daqueles que vale a pena ter em casa para assistir tomando um uísque, e digo isso em homenagem ao Vinícius, que chamou o uísque de "melhor amigo do homem, o cão engarrafado". Além do valor como entretenimento, o filme é importante para resgatar um momento da história brasileira. Mais que isso: para resgatar um momento da nossa personalidade coletiva. Há traços na personalidade de Vinicius que constituíam um pouco o Brasil daqueles anos 50 e 60, pré-ditadura. Uma ingenuidade, uma generosidade sem limites, uma paixão desmedida pela cultura popular, um altruísmo permanente. Chico Buarque é o que explica melhor essa coisa. Segundo Chico, Vinicius nunca ligou pra dinheiro. Quando começou a ganhar bem com a venda de suas músicas, enchia os bolsos de cédulas, entrava nos restaurantes e pagava tudo pra todos. Seu apartamento tinha sempre um estoque inesgotável de uísque e a porta estava permanentemente aberta para seus amigos e convidados.

Chico ressalta que esses traços de personalidade representam o oposto de tudo que vivemos hoje, não apenas no Brasil, mas no mundo. "Não sei onde o Vinicius poderia se encaixar no mundo de hoje", diz Chico, saudosista. "Hoje, há esse pragmatismo, esse interesse", observa o compositor. Em outras palavrás, Chico explica, que não há mais aquele viver por viver, aquela entrega total ao amor, à arte, à amizade, à vida, um tempo romântico que penetrou ditadura adentro através de pessoas como Vinicius.

Tenho pra mim, ainda, que esses valores estão ligados a uma classe que vivia seus últimos momentos de bonança. Até os anos 70, essa classe média alta tinha o monopólio da alta cultura brasileira e dos bons empregos, sobretudo do setor público. Desde os anos 60, o povão, aí compreendendo setores mais humildes da própria classe média, vinha batendo às portas dos bons cargos públicos. A partir dos anos 70 e 80, essa porta é arrombada.

O filme conta um pouco essa história, esse estertor dourado de uma classe privilegiada, uma zona sul carioca ainda não acossada pelo medo das favelas e o terror do desemprego. Uma classe de proprietários que gastou a herança de séculos em alguns anos de boemia.

Ferreira Gullar dá um depoimento emocionado sobre Vinicius: "lembro sempre do Vinicius rindo, alegre. Ele era um cara que elevava o nosso astral. Acho que a força dele estava aí. Eu gosto disso. Tem gente que gosta do pessimismo. Eu não. Sabe porquê? Porque eu acho que a vida é uma invenção. Se você quer inventar pro ruim, você inventa. Se você quer inventar pro bom, você inventa. Eu quero inventar pro lado bom da vida. Esses escritores que dizem, ah, a verdade da existência é terrível! Eu acho Beckett, por exemplo, um chatólogo! O sujeito desses pode até ganhar o Nobel, mas vai continuar sendo um chato!"

Vou lá ver outros filmes.

3 comentários:

Anônimo disse...

Oi!!!!
Adivinha quem é!!!!!!!!!!
Estou com muitas saudades!!!

Beijilhões,
Pri

Anônimo disse...

fazer um recorte bom da vida é até interessante pra não cair em depressão, gulart só esqueceu que o recorte é como o corte;depende da tesoura-faca, do papel-carne e da mão que corta. Será que depois de velho o ferreira virou um oba-oba neointelectopop como Caetano?

Roberto Iza Valdés disse...
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