Degenero ao sol-cão da minha crise

Inversamente, sou feliz no desespero: urubu sobrevoando carniças de vontades insatisfeitas. Estou solitário em minha tentativa de enlouquecer-me - triste liberdade que apodrece na agonia suja da noite.

Deus cego? Enchentes, furacões, maremotos, tudo sou, tudo devoro no afã de amar o mundo. Estuprei-me furiosamente no bar, onde almoçavam tubarões de gravata, proxenetas intelectuais sem orelhas, cujos mamilos brilhavam como sóis de plutônio.

Já sei: serei a favor das guerras. Inventarei novas formas de exploração, e uma nova risada de cinismo. Em mim, vivem pássaros angustiados, asas feridas e olhos argutos. Corromper-me-hei, mas não ao ponto de me tornar um deles, os meninos da televisão.

Não querem histórias? Em sacrifício, cortarei os pulsos de um outro eu, e beberei o sangue como quem se embriaga de champagne diante do pai morto. É isso! Serei infame, como eles. Como eles!

Falo do amor, mas subentende-se que é sobretudo o ódio que me move. Doce ódio pelo destino insosso de meu desatino. Não vou! Não serei arauto dos desvalidos de plástico. Meu não será um sim sangrento, armado, feroz e triste. Aurora envelhecida. Dez mil anos de sofrimento e compreensão produziram bilhões de imbecis. Já disse: defenderei as guerras, os bandidos, os traficantes. Morte às mães, às tias, aos jornais, aos amigos. Solidão e guerra, bandeiras do meu novo eu cínico: sucesso e dinheiro virão rápido, como cães, um suicídio.

(pintura: Flavio Shiró - Herança, 1996)

Um comentário:

Anônimo disse...

Oi, gostaria de ir ao evento. Sou produtoral cultural.

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