Novo desenho de Emerson Wiscow


Singela homenagem a John Fante, feita para a editora Spectro.
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Terei muitas dificuldades para atualizar este blog nas próximas semanas, até o final de novembro. Estou agitando e vivendo business trips no período. Depois conto mais. Abraço em todos.

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Com todo respeito aos amigos tucanos, continuo minha cruzada anti-Alckmin. Se não quiserem Lula, tudo bem. Votem nulo. O bom, velho e consciente voto nulo. Mas Alckmin não! Enquanto a corrupção do governo Lula se mede em milhões, a do PSDB se mede em TRILHÕES! E eles não só desconhecem (o famoso não sei de nada), como se orgulham do que fazem! E com beneplácito dos meios de comunicação, que querem voltar a mamar nas tetas adiposas dos financiamentos públicos!

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Sugestão de Blog literário legal e divertido:
http://marconileal.zip.net/

Diálogo de mestres


Breve conversa à tarde com John Fante

ele disse: “Eu estava trabalhando em Hollywood
na mesma época em que
Faulkner também estava lá
e ele era o pior de todos
estava sempre bêbado demais para ficar de pé
e ao final da tarde
eu tinha que ajudar a colocá-lo num táxi
dia após dia após dia”

“mas quando ele deixou Hollywood,
eu fiquei
e não bebi como talvez devesse ter feito
para ter o culhão de segui-lo
e dar um basta naquela merda”

eu disse a ele: “você escreve
tão bem quanto Faulkner”

“você acha mesmo?”,
ele perguntou, de sua cama
no hospital, sorrindo

Charles Bukowski
Tradução: Miguel do Rosário
Ler no original.

Ela entendia das coisas


Bebendo, Vida, invento casa, comida
E um Mais que se agiganta, um Mais
Conquistando um fulcro potente na garganta
Um látego, uma chama, um canto. Amo-me.
Embriagada. Interdita. Ama-me. Sou menos
Quando não sou líquida.

*
E bebendo, Vida, recusamos o sólido
O nodoso, a friez-armadilha
De algum rosto sóbrio, certa voz
Que se amplia, certo olhar que condena
O nosso olhar gasoso: então, bebendo?
E respondemos lassas lérias letícias
O lusco das lagartixas, o lustrino
Das quilhas, barcas, gaivotas, drenos
E afasta-se de nós o sólido de fechado cenho.
Rejubilam-se nossas coronárias. Rejubilo-me
Na noite navegada, e rio, rio, e remendo
Meu casaco rosso tecido de açucena.
Se dedutiva e líquida, a Vida é plena.

*
Também são cruas e duras as palavras e as caras
Antes de nos sentarmos à mesa, tu e eu, Vida
Diante do coruscante ouro da bebida. Aos poucos
Vão se fazendo remansos, lentilhas d'água, diamantes
Sobre os insultos do passado e do agora. Aos poucos
Somos duas senhoras, encharcadas de riso, rosadas
De um amora, um que entrevi no teu hálito, amigo
Quando me permitiste o paraíso. O sinistro das horas
Vai se fazendo tempo de conquista. Langor e sofrimento
Vão se fazendo olvido. Depois deitadas, a morte
É um rei que nos visita e nos cobre de mirra.
Sussurras: ah, a vida é líquida.


Hilda Hilst
(Alcoólicas)

Resgatando um comentário

Bem, tô publicando só para divulgar o comentário abaixo do escritor baiano Antônio Diamantino, apagado (o comentário, não ele) sem querer, junto com um post meu que era só um aviso sobre problemas técnicos, e por isso deletado. Valeu pela idéia, Diamantino. Concordo contigo que é preciso tomar cuidado com os teóricos. Eles esterilizam a poesia. Gostei da maneira apaixonada como Bloom escreve, mas não concordo com ele em várias coisas. Sobretudo, estou atento ao caráter místico, psicológico e dionisíaco da poesia. Fique tranquilo, não serei iludido tão facilmente. Grande abraço.


Comentário

Cuidado com o papo de teóricos como Bloom. Essas pessoas são como vampiros capazes de extirpar toda a vida do texto literário. São esses seres que transformariam os poemas repletos de alma de Miguel do Rosário em resenhas esdruxulas seguindo os padrões técnicos e científicos de entendimento na esfera academicista. Eles matam o poema em busca de um título.

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Posted by Antonio Diamantino Neto to Hell Bar at 10/17/2006 12:17:04 PM

Bagunça de luxo em Sampa




E aconteceu esta semana uma tremenda pândega literária na indefectível praça Roosevelt. Foi o lançamento de Atire no Dramaturgo, novo livro do brother Mario Bortolotto. Ainda tenho muito a falar sobre o tema. Ele está tentando achar um local de lançamento no Rio.

Harold Bloom com vista para o morro da Mangueira



Ontem passei algumas horas na varanda da biblioteca da Uerj, local que frequento há muitos anos. A vista dá para o morro da Mangueira, imponente e cheio de personalidade, o metrô, o trem, ao fundo a baía de guanabara e a ponte rio-niterói.

Fiquei lendo O Cânone Ocidental, de Harold Bloom, famoso crítico literário norte-americano. Bloom defende uma visão eminentemente estética da arte, ou seja, que contemple a arte sem falsos moralismos ou viciados sociologismos.

Interessante notar que Bloom, a despeito de sua erudição, procura dismistificar qualquer suposta superioridade do homen "intelectual" frente aos demais cidadãos. O estudo dos clássicos, ou cânone, não nos tornaria pessoas melhores. Pelo contrário, se baseássemos nossa moral apenas no estudo dos clássicos nos tornaríamos monstros de egoísmo, diz ele.

A afirmação de Bloom me fez lembrar de inúmeros "intelectuais" brasileiros metidos a besta e a publicistas políticos, que se gabam tanto de seus conhecimentos literários, apesar do péssimo uso que fazem deles. A ideologia é burra, é um dos lemas da nova direita, omitindo de si mesma que a máxima vale tanto para a esquerda quanto para a direita.

Bloom não se ocupa de que forma os homens podem se tornar melhores. Seu campo é a estética, e para operar livremente ele afasta qualquer inferência moral ou política da análise literária.

Antônio Cândido, o famoso crítico brasileiro, não é tão peremptório quanto Bloom. Cândido tentará realizar uma síntese dialética entre a análise literária puramente estética, defendida por Bloom e a sociológica, defendida por outros autores.

Confesso que me inclino mais para a posição de Bloom, embora reconheça a coerência lógica do entendimento de Cândido, cuja estrutura teórica, inclusive, me parece melhor indicada para dar conta das transformações inerentes ao uso da internet como veículo de comunicação literária.

A grande novidade da internet, no terreno da literatura, a meu ver, é a interação, que transforma a maneira como lemos e, consequentemente, também irá mudar a forma como escrevemos um texto.

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Frases interessantes pescadas no livro de Bloom:

"Resenhar livros ruins, observou certa vez W.H.Auden, faz mal ao caráter".

"Ler os melhores escritores, digamos, Homero, Dante, Shakespeare, Tosltói, não nos tornará melhores cidadãos".

"A arte é inteiramente inútil, segundo Oscar Wilde, que geralmente tinha razão a respeito de tudo".

"Toda má poesia é sincera".

"O Cânone Ocidental, seja lá o que for, não é um programa de salvação social".

"A gente só entra no cânone pela força poética, que se constitui basicamente de um amálgama : domínio da linguagem figurativa, originalidade, poder cognitivo, conhecimento, dicção exuberante".

"Se lermos o Cânone Ocidental para formar nossos valores morais, sociais, políticos ou pessoais, creio firmemente que nos tornaremos monstros de egoísmo e exploração".

"Ler a serviço de qualquer ideologia é, em minha opinião, não ler de modo algum". (essa vale para certo jornalista político que acha que Dante e Robert Musil escreviam para defender o PSDB)

"Ler a fundo o cânone não nos fará uma pessoa melhor ou pior, um cidadão mais útil ou nocivo".

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O romance Assunção de Salviano, de Antônio Callado, é uma sucessão de clichês. A escrita de Callado é elegante, como sempre, mas a história em si é fraca. Além disso, há um artificialismo visível no texto, como se pudéssemos enxergar suas engrenagens íntimas. O romance conta as aventuras de uma célula comunista em Juazeiro, Bahia, que trabalha para produzir um foco revolucionário no Nordeste. Um dos "quadros" simula uma conversão religiosa e torna-se um "profeta", uma espécie de Antonio Conselheiro, pregando a fé e a revolução social. Ocorre que Manuel Salviano acaba assumindo de verdade o papel que lhe cabia apenas representar e passa a acreditar em Deus, pregando cada vez menos a revolução e mais a salvação da alma. As multidões passam a venerá-lo e até milagres acontecem. O enredo em si não é mal, apesar de ser um tanto forçado (o autor queria incluir luta de classes, comunismo, revolução, na história, certamente por serem, na época, temas polêmicos). Os defeitos são muitos, mas pode-se resumi-los por: diálogos banais, dicção pobre, trama medíocre e inverossímil e personagens simplórios, maniqueístas, previsíveis.

Quem é maluco?



Melhor ser maluco que ser burro. Não estou aqui querendo provar nada. Let me sing my rock and roll. Raulzito mandando ver de novo.

Contra Alckmin


Só não vote nesse falso moralista aí de cima. Opus Dei do caralho. Vote Raul! Dá-lhe Raulzito! Ouça aqui Raulzito fazendo campanha.

A eterna luta contra o mau poeta que há em nós

No final dos 80's eu tocava violão e compunha músicas de amor. Esqueci tudo e não guardei nada. Lembro apenas, vagamente, que eram canções bregas, embora haja sim a possibilidade de eu ter assassinado algumas canções boas. Mas acho difícil. O Paulo Mendes Campos, numa de suas crônicas (presente no livro Anjo Bêbado), fala desse negócio do escritor ter de matar, diariamente, o mau poeta que há nele. Com certeza, grande Paulo. Os maus poetas nos habitam, às vezes nos dominam.

Quando falo de poesia, falo de literatura. Penso que é tolice esse preconceito que aflorou entre certos literatos contra poesia. Como se a poesia não fosse literatura. A literatura nasceu do poema. Aliás, a literatura moderna, a meu ver, está voltando muito à poesia. Há romances "modernos" que, se transcritos em versos, seriam pura poesia. E há poesias modernas que, diagramadas de outra forma, poderiam ser classificadas como prosa.

Está claro que alguns cidadãos, movidos por necessidade pecuniária, falta de alternativa econômica e certo (quiçá duvidoso) pendor para as letras, decidem se tornar poetas e vender seus livrinhos caseiros em bares, faculdades, na entrada de cinema e centros culturais. Quem já não enfrentou o famoso:

- Gosta de poesia?

Particularmente, não acho uma boa maneira de veicular a poesia. Para muitos, a abordagem é irritante, sobretudo se o poeta resolve explicar, em detalhes, o processo que usou para idealizar, escrever, diagramar e imprimir seu produto. No entanto, compreendo perfeitamente a situação do cara. Não sou eu que condenarei o poeta-camelô. Em teoria, é um ato corajoso, uma afirmação de independência artística. Acho legal o artista ampliar o controle sobre suas atividades. Fica mais livre e, muitas vezes, é a única maneira de ganhar algum dinheiro.

Contudo, também acho desagradável. Fujo dessas abordagens assim como fujo de militantes evangélicos, entrevistadores para campanhas de marketing e ciganas-desesperadas-para-ler-sua-mão.

No entanto, tenho pelo menos dois grandes amigos que vivem de vender poesia nas ruas. Mas esses são extremamente sagazes, abordando apenas pessoas que, notoriamente, demonstram interesse no produto. Em alguns meios, aqui no Rio, sou conhecido apenas como poeta, apesar de, há anos, escrever bem mais prosa que poesia. Conheço inúmeros poetas, a maior parte dos quais desconhecidos do público em geral, embora possuam um trabalho consistente pra caralho. O problema deles é que não exploram bem a internet e não possuem nenhum, nenhum, nenhum talento (pelo menos por enquanto) para venderem a própria imagem. Neste sentido, são completamente desajeitados. Ou puros, por outro ângulo. Românticos, utópicos, fracassados. No entanto, libertos de toda inveja (o que não é necessariamente uma qualidade, mas eles são assim). Altivos, irônicos, quase felizes - não fosse o desespero constante da falta de grana.

Por falar em poesia, deu vontade de escrever uma (quem sabe faz ao vivo).


a cerveja da geladeira


atrás de mim há uma geladeira
com várias latinhas de bavária
compradas no Mundial por 0,79 cada

enquanto escrevo, penso nelas, nas latinhas
penso particularmente em uma
a que porventura eu poderia abrir e beber
caso interrompesse a escrita, nesse momento,
me virasse, abrisse a geladeira
e a colhesse diretamente da árvore

parei

fui lá e peguei a cerveja
são 5:58 da manhã e sou um louco
bebendo cerveja em casa e escrevendo um poema

vou acordar tarde novamente
contrariando meu eterno plano de ir correr
no aterro às seis da manhã
trabalhar duro até o meio dia
almoçar, descansar a siesta
e passar a tarde lendo

tudo bem

agora vou acordar meio-dia
trabalhar até o meio da tarde
ler um livro
dar uma caminhada pelo centro antigo do rio
contemplando a beleza
dos casarões em ruínas

Notícias finais do Festival

C'est fini. O Festival do Rio chegou ao fim, com uma festa meia boca na Tenda de Copacabana. Não tinha uísque, vinho, champagne. Cerveja, só nova schin. O som estava bom, pelo menos. Rolou Bezerra da Silva, Chico Science, Erasmo Carlos, Elizeth Cardoso, entre outros. Mas terminou cedo, às três, quando o negócio ainda estava esquentando. Nem deu tempo pra eu ficar bêbado.

O filme premiado pelo júri oficial foi Céu de Suely, segundo longa de Karim (o primeiro foi Madame Satã). O público deu o prêmio para Cheiro do Ralo, de Heitor Dhália. Pra mim, os prêmios foram merecidos. Os dois são bons filmes.

O curta mais premiado foi Mauro Shampoo, disponível aqui no Porta Curtas.

À margem do concreto, de Evaldo Mocarzel, ganhou prêmio de melhor documentário, no júri oficial. Fabricando Tom Zé levou o "Redentor" de Júri Popular.

Ganharam prêmios ainda Selton Mello (melhor ator, em Cheiro do Ralo), Hermila Guedes (melhor atriz, em Céu de Suely) e Karim (melhor diretor, idem).

Revival

Estou fazendo uma revisão do histórico desse blog e achei umas coisas cuja releitura me divertiram. Acho legal fazer um revival de vez em quando.

1) A poesia dá sede, resenha do livro Tanto Faz, de Reinaldo Moraes
2) O lago escuro, poema de minha autoria.

Eu me lembro

Bons filmes nesta segunda semana de Festival. Cartola, de Lírio Ferreira, é um documentário fundamental para quem deseja compreender o que foi e o que é o samba carioca e, consequentemente, o que foi e o que é o Rio de Janeiro. Filme feito inteiramente, ou quase, com imagens de arquivo, umas antigas, outras mais recentes, com uso constante de pout-pourri (não sei se é assim que escreve...), ou seja, cenas rápidas extraídas de clássicos do cinema nacional, ilustrando as épocas. Notável ainda a persistência de Lírio, que levou oito anos para finalizar a película.

O filme de Lírio foi precedido pelo curta-metragem "O Som da Luz do Trovão", de Petrônio Lorena e Tiago Scorza, que também é muito interessante, feito com audácia e criatividade.

Por fim, "Eu me lembro", novo longa-metragem de Edgar Navarro, grande cineasta baiano, me comoveu. Navarro é conceituadíssimo entre especialistas e amantes do cinema nacional. Lindo, lembrou os antológicos romances que mesclam ficção e memórias, como Bukóswki, Miller, Fante, e mesmo o londrinense Márcio Américo, autor de Meninos de Kichute.

Assisti um documentário bem interessante sobre a vida e morte de um líder sindical do Pará, "Expedito: em busca de outros nortes". E outro fantástico sobre a vida dos três irmãos Souza. Betinho, Henfil e Chico Mário: "Irmãos de Sangue". O filme, também bancado pela Petrobrás, conta a história desses três irmãos que, cada um com seu talento, participaram ativamente da vida cultural e política do Brasil.

Vi também um filmaço de Visconti, no recém inaugurado Centro Cultural da Caixa Econômica, "Os deuses malditos".

Ontem, no Cine Palácio, foi exibido a cópia restaurada de "Como era gostoso meu francês", o clássico de Nelson Pereira dos Santos. É um filme muito bem feito, mas prefiro outros do Nelson, como Rio 40 Graus, Boca de Ouro, O Justiceiro, Vidas Secas, Memórias do Cárcere. O "Como era gostoso meu francês" é um elaborado filme de época, passado no Brasil colônia, nos tempos em que os franceses ocupavam a Ilha de Villegainhon (o nome certamente está escrito errado), no Rio de Janeiro, e aliavam-se aos tupiniquins para combater portugueses e tupinambás. História bem escrita. O único problema é o excesso de homens pelados. O tempo todo aquelas picas na nossa cara. Pequenas, médias, grandes. O cacique tem pau pequeno, o francês tem uma manjuba enorme. Isso achei sacanagem, anti-patriota da parte do Nelson, dar esse crédito ao estrangeiro. Caralho, chega de picas, socorro. Mudando de assunto, urgente.

Quer dizer, mudando de assunto nada. Acabou a crônica. Té mais.

PS: A festa de encerramento e entrega de prêmios é na quinta-feira 05.

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