Os escritores - pequena novela auto-satírica

Eu queria escrever um romance sobre escritores. O protagonista da história seria executivo de grande editora, que recebe a missão de pesquisar todos os sites e blogs de literatura no Brasil para encontrar grande talento literário ainda desconhecido da mídia e do público. A história seria contada como se o tal executivo atualizasse um blog, criado especialmente para que sua chefe monitorasse suas pesquisas. O blog seria acessível mediante senha, visto que a editora queria evitar que as concorrentes acompanhassem os resultados.

A história começaria mais ou menos assim:

Bom dia, Clara (já que você é minha única leitora, posso cumprimentá-la pessoalmente). Ontem passei a noite inteira navegando pela net. Estou organizando a pesquisa. Primeiramente, estudarei somente sites, depois passarei para os blogs. Ontem acessei dezenas de revistas eletrônicas de literatura. Notei que existem, basicamente, dois tipos de revista. Um é o tipo "puta", desculpe o termo, mas é perfeito para sintetizar o que quero dizer. Esse tipo dá para todos, publica qualquer um que envie texto, ou quase todos. Seus arquivos de contos e poemas acumulam uma quantidade incrível de contribuições. Neste segmento, há o Garganta da Serpente, o Releituras, o Paralelos, o Jornal de Poesia. Não me parece que haja um critério muito rigoroso de seleção.

O outro tipo de site é mais voltado para publicações de colaboradores fixos, apesar de aceitarem também, em menor escala, contribuições. Temos o Patife, o Bagatelas, o Storm.

Temos alguns tipos que merecem menção especial, porque fogem das definições acima expostas. Como o Bestiário, revista mensal de contos e o Cronópios, que é bastante aberto à colaborações, mas publica principalmente textos das mesmas pessoas. O Arte & Política também tem essas características, sendo que os textos do próprio editor, Miguel do Rosário, são os mais repetidamente publicados. E por falar no Rosário, gostaria de chamar sua atenção para esse jovem escritor carioca, que produz poemas, contos e crônicas com frequência e intensidade invejável. Eu entrei em contato com ele e marcamos um encontro numa cervejaria. Depois lhe conto como foi.

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Bom dia Clara. Hoje estou com uma ressaca horrível. Fui me encontrar com o tal Miguel do Rosário, numa cervejaria que ele mesmo escolheu na Lapa, e acabei me excedendo no consumo de álcool, por isso não espante com a conta que lhe mandei em email anterior. Bem, é o seguinte. O tal Rosário é uma pessoa extraordinária, até certo grau de alcoolismo. Parece ter lido todos os livros e conta histórias fabulosas que lhe aconteceram ou não lhe aconteceram como ninguém. É uma pessoa bem excêntrica, a começar pela aparência: é cego de um olho e manca da perna direita. Mesmo assim, não deixa de ser elegante e, porque não dizer, até bem atraente. É alto e muito magro, com feições algo vulgares que lhe conferem uma certa virilidade. Digo tudo isso porque você me pediu, mas não sei o que isso tem a ver com a linha editorial da empresa.

Por sua conversa, notei que ele se interessa muito por artes plásticas e cinema. Trouxe-me também um grosso maço de papéis com seus poemas. Disse-lhe que só nos interessávamos por contos e romances, mas ele fez questão de recitar-me algumas poesias.

Também trouxe os originais de seu primeiro romance, Parabellum, uma história muito louca de um cineasta que decide fazer um filme sobre Lampião, o cangaceiro, e descobre que há um tesouro enterrado em uma fazenda do Sergipe.

Aí fomos bebendo, bebendo, até que saímos daquele bar e fomos dar umas voltas na rua e escolher outro boteco. Ele levou-me até a esquina da Riachuelo com a Lavradio e sentamos-nos num bar cheio de putas e travestis. Aí a coisa começou a degringolar.

Sem nenhum motivo aparente, ele começou a me ofender, da forma mais gratuita e grosseira. Mandou-me tomar no cú e acusou-me de ser um vendido para o capitalismo mais rasteiro do terceiro mundo. Bateu a mão no peito e se auto-intitulou "anarquista republicano". Disse que não queria se vender a nenhuma editora estrangeira e que iria publicar ele mesmo seus próprios livros. Falou assim mesmo: "não quero saber de porra de editora grande nenhuma. Vão se fuder! Você e sua chefe escrota!".

Um final de noite lamentável. Nem me dignei a responder uma estupidez daquele quilate. Fiquei muito frustrado porque o rapaz tinha me parecido, a princípio, bastante inteligente. Como pensa ele em ganhar a vida com literatura, se já começa xingando seus editores? Só pode ser burro ou doente mental. Levantei-me, deixei um dinheiro para pagar a conta, chamei um táxi e fui embora. Pela janela do carro, ainda o vi fazendo um gesto obsceno para mim. Enfim, o rapaz tem talento, mas sem nenhuma condição de ascender socialmente ao mundo dos escritores famosos.

Hoje à noite vou me encontrar com um outro jovem escritor desconhecido. Seus textos não são lá grande coisa, mas me parece que é muito mais educado. De qualquer forma, continuo pesquisando. Até mais.

3 comentários:

Julio Cesar Corrêa disse...

sites tipo puta é ótima. Só quero ver como vai acabar esta novela
gd ab

Anônimo disse...

voce viu que o paulo entrou para a Planetq

Anônimo disse...

o paulo coelho, quero dizer, saiu da rocco e entrou para a planeta

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