Sugestões para uma nova política literária

Delicadíssimo, como sempre, escrever sobre literatura. Mas é necessário. Ainda mais após a divulgação, durante a Bienal do Livro, no Rio, de que a maior parte dos municípios brasileiros não possui nem UMA livraria. E uns quarenta por cento não tem nem biblioteca pública.

Como é que a indústria do livro pretende aumentar a vendagem no país com um quadro desses?

Aliás, como é que os escritores podem conviver com esses números com tanta passividade?

Por quê não gritam, não ocupam os espaços dos jornais, revistas, sites, e denunciam, com argumentos poderosos, o prejuízo que isso acarreta para o nível cultural do país?

Que nova literatura poderá vingar num país onde um percentual ridiculamente minúsculo tem acesso ao que se produz de novo? O resultado é que uma "inteligentzia" altamente duvidosa acaba por monopolizar o discurso estético no país. Acontece com as artes plásticas, acontece com a literatura, os dois segmentos que demandam um consumidor mais intelectualizado. Mas no fundo, não é a "inteligentzia" que está errada. O que acontece é que ela está sozinha, e esse isolamento a torna egoísta.

Há também um certo comportamento mesquinho por parte de escritores e produtores de arte. Diz-se que há escritores demais, como se isso fosse negativo. Na verdade, isso é muito bom. Naturalmente, muitos vão comer o pão cuspido pelo demo, mas a quantidade se convertará em qualidade, na medida em que a própria competitividade obrigará à elevação do nível de todos.

Nos anos 70, não haviam tantos escritores. E muitos "medalhões" daquela época, talvez fossem apenas mais um entre tantos jovens talentosos que vemos emergir aos milhares nos sites de literatura.

A displicência que alguns acusam na literatura brasileira contemporânea é uma denúncia vazia, reacionária. As novas tendências literárias que se delineam no país beberam na rica fonte da literatura despojada, desburocratizada, de dezenas de autores que, se até os anos 70, eram conhecidos por uma minoria entre as minorias, agora foram amplamente assimilados pela juventude brasileira.

E quando digo juventude, me refiro a todo produtor cultural de mentalidade jovem, que continua querendo inovar, que não se estagnou numa atitude blasé e auto-suficiente. O escritor jovem é aquele que continua desesperado, angustiado, para dizer alguma coisa de verdadeiro, de autêntico, de juntar algumas frases que sintetizem a beleza rude, transcedental, misteriosa, desse país onde os sabiás não cantam: fogem da polícia.

Claro que, se há jovens que desafiam impetuosamente as maiores dificuldades, e prosseguem sonhando em fazer arte, também existem segmentos reacionários, que ingressaram no mercado de arte como quem faz carreira numa profissão burguesa. Como era de se esperar, fazem um tremendo sucesso. Desde séculos, os oportunistas se dão bem, ou tentam se dar bem. Faz parte da vida. Aos poucos, eles vão sendo desmascarados.

O grande problema é: a literatura brasileira está sufocada com a falta de novos leitores. O país é grande, teria capacidade de aumentar em duas, três, quatro vezes, o número de consumidores de livro. Recentemente, um grupo de empresas ligadas ao mercado editorial (grandes editoras, livrarias) conseguiu arrancar do governo, via BNDES, uma boa verba para financiamento. Basta isso? Quer dizer, claro que é importante que as editoras se fortaleçam, cresçam. São elas, no fim das contas, que imprimem livros, bancam o marketing e a distribuição das obras.

As livrarias protestaram que o pacote do governo não atendeu seus interesses. E o maior problema é que faltam livrarias nas pequenas e médias cidades do país. Mas acho que se o governo liberar dinheiro para as grandes, elas vão pegar a verba e construir mais super-lojas nas metrópoles.

O governo deveria, então, liberar financiamento para pequenas livrarias, com proprietários locais, nas pequenas cidades brasileiras. E ajudá-los de todas as formas possíveis.

É preciso que medidas sejam tomadas para ampliar o número de leitores no Brasil. Qualquer aumento seria uma injeção de oxigênio no mercado editorial. E de ânimo nos jovens escritores, já que veriam reduzido o poder de influência de meia-dúzia de mauricinhos que posam de grandes críticos literários.

Para que medidas sejam tomadas, os escritores desse país precisam botar a boca no trambone, pressionar as autoridades, influenciar a opinião pública. João Ubaldo Ribeiro, por exemplo, em vez de ficar enganando os leitores do Globo com seu rosário de abrobrinhas, atacando os índios ou enchendo o saco do Lula por quaquer coisinha, podia contribuir um pouco para isso. O aumento dos leitores de literatura brasileira seria benéfico financeiramente para todos os escritores consagrados. Portanto, está aí uma bandeira realmente progressista, saudável, que reuniria gente de todos os matizes ideológicos.

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